segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Descer ao Campo - Yves Winkin

Como sugerido pelo próprio nome, o texto Descer ao campo parece de grande utilidade nesse nosso momento de “pré-saída à campo” pelas ruas do centro de Belo Horizonte. Como em uma espécie de manual, o autor propõe métodos que podem auxiliar estudantes, como nós, leigos no trabalho de pesquisa etnográfica, baseado na observação e análise do ambiente observado.

Mas, antes de começar a orientar um trabalho de campo, o autor esclarece de forma sucinta as modificações sofridas no modo de se conceber a etnografia. Segundo Winkin, a mesma passou por 3 revoluções: uma por volta de 1915-1920, em que o próprio estudioso passou a sair a campo, para coletar seus dados (antes era uma tarefa XX a outros); outra por volta de 1930-35, em que os antropólogos passam a olhar para dentro da própria cidade e país, ao invés de buscar estudar locais distantes; e, por fim, nos anos 50, em que os objetos de estudos extrapolaram apenas os pobres, os desajustados, os dominados, surgindo uma concepção de cultura, por Ward Goodenough, de que ela é tudo o que é preciso saber para ser membro, permitindo se fazer antropologia fora das ilhas. Dessa forma, chega-se, assim, a uma concepção da etnografia que permite que ela seja utilizada em diversos contextos e circunstâncias, inclusive no nosso trabalho de campo, realizado sob um viés da comunicação social: a etnografia se tornou uma arte de ver, arte de ser, arte de escrever. E é a partir desse conceito, que o autor continua seu texto, agora pronto para dar as primeiras coordenadas para um trabalho de campo.

Winkin elabora uma espécie de manual, com certas regrinhas que podem auxiliar e facilitar a saída de campo. No momento da escolha do local, por exemplo, ele sugere que o mesmo seja público ou semi-público, que lhe permita ir e vir no plano das relações com os outros, do psicológico e do físico, que sejam confortáveis, simples e não perigosos, etc. Fica mais fácil escolher um local acessível, em que você pode ir e voltar quando quiser, de maneira fácil e confortável. Além disso, ele também sugere que observação possa ser sistematizada, permitindo sua transcrição através de mapas espaciais e temporais. Dessa forma, podemos determinar fronteiras, das quais já discutimos em aulas anteriores, inclusive na passada, através do texto A guerra dos lugares (o qual também foi feito através de trabalho de campo, o qual, cabe analisa-lo, agora, com um olhar sobre seu modo de produção). Voltar sempre à teoria também se mostra de suma importância no trabalho de campo, porque a teoria vai levar a ver mais e mais longe (p.135). Ele cita exemplos sobre essa utilização através de teorias de Goffman, as quais nos fazem perceber que, de fato, recorrer à teoria transforma nosso olhar, levando-nos a ver o ambiente de forma mais vasta e diferente, ampliando nosso horizonte de observação.

Outro fator essencial para um trabalho de campo é o uso do diário. Através dele, o pesquisador registra suas observações ao longo de toda a saída, bem como suas reflexões, leituras e até frustrações, para futuras releituras e sucessivos comentários. Dessa forma, as anotações possibilitarão a criação de configurações, que surgem de regularidades notadas ao longo da pesquisa, que permitem a formulação de códigos. Para o autor, ainda que se possa usar outros métodos de registro, como fotografias e gravadores, a anotação, porém, mostra-se a mais eficaz no momento da observação, a qual para ele, deve ser feita sempre às claras quanto aos objetivos. Disfarces ou observação escondida, jamais!

E, para não nos desanimar, Winkin aponta dificuldades, enfrentadas por quase todos aqueles que iniciam a prática de trabalho de campo, como a impressão de que não conseguimos enxergar nada no local, ou de se sentir estranho e inconfortável no mesmo, ou a si mesmos. Ou seja, são fatores que nos levam a fugir do trabalho. Mas ele aconselha: dêem conta dos mesmos, tranqüilizem-se e encarem-nos. Seja escrevendo as angústias no diário, seja fazendo mapas e desenhos do local, seja, até, escrevendo cartas ao colega.

Aliás, escrever. Esse ato ganhou importância e atenção a partir dos anos 80 como um aspecto de suma importância no processo de pesquisa antropológica. A revolução textualista, como foi chamada, fez com que a idéia de que os dados falam por si mesmo, mudassem para a concepção de que o texto pode facilitar ou não o modo de apreensão da pesquisa.

E, para finalizar o texto, o autor expõe certas questões. Entre elas, a forma com que o campo deve ser tratado – como um local onde observamos a comunicação, ou um contexto sem o qual a mesma nem existiria? De forma operacional, ele sugere que consideremos o lugar como um reservatório de comportamentos, no qual, pouco a pouco, surgirá certa ordem interacional, a qual, também se mostrará da ordem social. Outra questão, à qual a reposta positiva constitui o fundamento do trabalho etnográfico, é a de que o universal pode estar no coração do particular. Para ele, As regularidades extraídas de um conjunto particular, acarretam em regras que extrapolam para o social. Afinal, essas quanto mais precisos somos, mais estamos em condições de generalizar. Fato no qual também acredito. São a partir de pequenos ambientes, os quais, afinal, constituem e formam a sociedade, que conseguiremos entender e analisar o aspecto geral da mesma. Caso contrário, um estudo seria meramente impossível de ser realizado, diante da grandeza e complexidade de sua natureza.


Ana Cláudia Paschoal

3 comentários:

Comunicação e Culturas Urbanas UFMG disse...

Ptz! Abri o blog, não vi postagem sobre o texto. Escrevi sobre ele, e quando fui postar...Carla já o tinha feito. Mas como também já tinha escrito tudo, deixei....=)

viajero disse...

Então,
a etnografia tornou-se uma ferramenta lançada mão por antropólogos, no início do século XX (o mais notável como pioneiro no uso dessa metodologia foi Malinowski), essencial para o desenvolvimento da antropologia como disciplina. Atualmente, a etnografia não é uma ferramenta exclusiva dos antropólogos, sendo um meio, bastante eficaz, de conhecimento de uma realidade a ser estudada.

DENTRODACHINA disse...

Oi, vc teria este texto do WINKIN, Yves na integra?