Pessoal, como todos nós devemos, uma hora ou outra, postar aqui um comentário sobre um dos textos discutidos em sala, resolvi falar de trabalho de campo e usar um pouquinho do texto da última aula. Perdão se não acrescento nada ao que já foi falado, mas não presenciei a discussão em sala e só agora vi que já foram postados outros comentários sobre esse mesmo texto...
Bom, acho que podemos nos reter nas exigências apontadas pelo autor para a realização de um trabalho de campo etnográfico dentro de nossa própria sociedade. A primeira delas não nos causa problemas, já que a própria disciplina nos encaminhou dessa forma: o local de campo deve ser público ou semipúblico, um lugar comum. A segunda é que a observação que vamos fazer seja sistematizável, e a terceira, um pouco mais complicada no nosso caso, implica no constante trabalho de freqüentar o “campo” e ler o “campo” intercaladamente, recorrendo sempre à teoria.
No final da aula escutei a Milene dizer “vocês têm que saber o que vão olhar!”. O que isso tem a ver com as exigências acima? Tudo! Todo saber é relevante para a Antropologia. Isso quer dizer que qualquer prática humana (já que nosso objeto de estudo são os seres humanos) pode ser objeto da Antropologia, acertada uma maneira de observar e de descrever essa observação. Quando se vai a campo tem-se um problema de pesquisa, uma hipótese, uma dúvida... algum interesse específico. Cada um de nós pode olhar para uma coisa específica na quita feira - para o trânsito, para os “homens que vivem abaixo da linha de pobreza”, para o comércio irregular - e o que cada um de nós vai trazer dessa experiência é o que cada um desses olhares filtrar.
O antropólogo Evans-Pritchard, num apêndice de um trabalho sobre os Azande, onde faz uma reflexão sobre o “fazer campo”, escreve: “Na ciência, como na vida, só se acha o que se procura. Não se pode ter as respostas quando não se sabe quais são as perguntas” (EVANS-PRITCHARD, ?: 243). Gosto muito quando ele diz ser inútil sair para o campo às cegas, e necessário “saber exatamente o que se quer saber” (idem: 244), mas logo em seguida, alerta para os imponderáveis da pesquisa e relata sua experiência:
“Eu não tinha interesse por bruxaria quando fui para o país zande, mas os Azande tinham; e assim tive de me deixar guiar por eles[1]. Não me interessava particularmente por vacas quando fui aos Nuer, mas os Nuer, sim; e assim tive aos poucos, querendo ou não, que me tornar um especialista em gado” (idem: 245).
Eu quis contar isso pra vocês porque “fazer campo” é, sim, buscar respostas, mas é também se deixar tocar por aquilo que pulsa além de nossos interesses. E, voltando às exigências – eu já havia me esquecido delas – nas ruas do centro de Belo Horizonte encontraremos muitas possibilidades de sensações e de registros, e para que alguma informação seja posteriormente sistematizada (lembrando dos nossos limites, especialmente TEMPO), principalmente porque os lugares comuns “vão revelar-se à análise terrivelmente complexos” (?[2], ?: 133), seria legal manter-mos algum foco – naturalmente de maneira flexível à bruxaria dos Azande e às vacas dos Nuer. O que vocês acham?
Por último, sobre a terceira exigência de ir-e-vir da prática à teoria, já que não vamos à prática tantas vezes quanto recomendado pela etnografia, devemos nos orientar nessa saída única pelo centro, por tudo aquilo que discutimos em sala até agora, ressaltando que o que se traz de um estudo de campo depende daquilo que se leva para ele.
Abraços e até quinta!
Isadora.
[1] Detalhe: para quem não se interessava por bruxos e porções mágicas alguma coisa mudou: o nome desse livro é “Bruxaria, Oráculos e Magia entre os Azande”.
[2] Falta indexação do texto “Descer ao campo”.
terça-feira, 30 de setembro de 2008
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