segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Caminhar no centro

O centro, pra mim, sempre foi o lugar do caos, da correria. Aquele lugar onde as pessoas passam – ou estão – sempre com pressa, indo ou voltando, mas sempre correndo. A questão da segurança também se mistura aí: com tantos assaltos acontecendo por aí, o centro da cidade não é o lugar mais indicado para um passeio tranqüilo...

Além disso, a discussão sobre o modo como o corpo deixa marcas e é marcado pela cidade me interessou bastante. Para mim era claro que, ao estar e se movimentar no centro, o corpo das pessoas assumiam uma outra postura – seja pela rapidez do caminhar, pelo medo de ser assaltado ou mesmo por outros motivos. O que eu queria observar era se isso acontecia com todos e qual era esse novo jeito do corpo estar no centro da cidade. (Essa decisão não foi tão fácil quanto aparece descrita aqui... eu tinha outras opções, mas todas eram de certo modo todas relacionadas com a inscrição do corpo na cidade. De todo o material que tenho da deriva, esse me pareceu mais interessante...).

Iniciamos nosso percurso pela avenida Afonso Pena. Logo já percebi aquele caminhar frenético. Claro que também existem aqueles que “passeiam” pelo centro, mas meu olhar não está voltado para eles. Mesmo porque, quando não estou no centro “a trabalho”, eu odeio essas pessoas que passeiam no centro da cidade. Eu estou lá, andando – ou será correndo? – e de repente a pessoa da minha frente pára para olhar uma vitrine. E aquelas que impedem a ultrapassagem? Passeiam devagar e ocupam toda a calçada. Não, não tenho essa paciência.




Bolsas debaixo do braço e coladas ao corpo. O braço que não carrega nada está sempre balançando, até mesmo nas pessoas que caminham com um ritmo menor. A mãe anda com os filhos colados, como se pudesse perdê-los. As amigas também andam de braços dados.

Ao longo de todo o trajeto eu via o mesmo movimento. E uma outra coisa que notei: a maioria absoluta das pessoas andando pelo centro são mulheres (a rua Guaicurus era um lugar em que a maioria das pessoas eram homens, mas isso tem explicações “históricas”...). A minoria dos homens que notei, percebi que de forma diferente. A velocidade é menor e eles também não tem essa necessidade de andar com suas bolsas – pochetes, pacotes ou qualquer outra coisa similar a essa peça típica do guarda-roupa feminino – colada ao corpo. Alguns homens também andam conversando ao celular sem se importar.




Não sei se essa diferença na maneira de caminhar se deve à um sentimento de fragilidade, se as mulheres se sentem mais sujeitas a assaltos e menos capazes de reagir em situações como essa. Ao contrário dos homens, que não são alvos tão fáceis. Talvez essa pressa também possa ser algo da natureza da mulher.

Esse ritmo frenético, no entanto, foi diminuindo à medida que avançávamos no trajeto. Na rua da Bahia – perto do Parque Municipal – e na avenida dos Andradas – principalmente perto da Praça Rio Branco, as pessoas andavam mais em ritmo de passeio. Eu percebia que aquelas que vinham da avenida Amazonas estavam num ritmo e que, quando chegavam na praça, parecia que tinham um momento de descanso. Não sei se a presença de uma multidão ou se a concentração de comércio ajuda a imprimir esse ritmo às pessoas. Mas é visível que em lugares mais vazios, com menos pessoas se espremendo e menos lojas, o caminhar das pessoas se torna quase aquele caminhar de bairro (Quase! As bolsas debaixo do braço e o balançar do braço desocupado, continua...).




E por falar nesse caminhar de bairro, gostaria de fazer um comentário sobre a Praça. Assim como o Parque Municipal, a Praça Rio Branco parece um outro mundo colocado no centro da cidade. Ali as pessoas namoram, conversam ou mesmo ficam ali, vendo o tempo passar. per Ao contrário do que eu pensava, o centro da cidade não é apenas um lugar de passagem. Diversas outras relações se estabelecem ali.



Uma senhora passa seus horários de almoço tricotando. Eu paro, pergunto se posso tirar uma foto. Ela diz que sim e pergunta que curso eu faço. Eu digo que faço comunicação e ela me conta sobre sua neta, que faz o mesmo curso na Puc. O centro é tão cheio de pessoas, mas mesmo ali, na multidão e na bagunça, percebe-se momentos de solidão...


A rua Guaicurus, por sua vez, parecia um grande ponto de encontro. Funk nos bares e cheiro de churrasco. Mulheres de shortinho e blusas decotadas. Pessoas bebendo. Muitos pontos de ônibus. O caminhar ali também não parecia tão apressado quanto em outras partes.




Ao voltar para as partes mais comerciais do centro – avenida Santos Dumont, rua Rio de Janeiro (onde estava o moço do alho... posto o vídeo depois), novamente a Afonso Pena – o caminhar frenético e apressado também retorna. Mãos cheias de sacolas de compras, passos apressados e pessoas.




Ao terminar o texto percebi que não fiquei totalmente presa ao caminhar e que outros comentários foram surgindo. São fatos ou sensações que de certa forma, também marcaram minha experiência no centro – como a senhora que tricotava na praça Rio Branco ou o funk tocando na Guaicurus. Mas o foco da observação, quer dizer, desse texto, era o caminhar. Caminhar que eu supunha mais ou menos homogêneo – sempre apressado e frenético - e que, no entanto, se revelou muito diverso. Posso até dizer que existem alguns traços comuns em todas essas formas de andar pelo centro e duas características são marcantes me parecem marcantes, seja o caminhar lento ou rápido: as bolsas – no caso das mulheres – sempre perto do corpo e o braço solto que está sempre balançando.

Alguns passeiam apreciando a paisagem, outros andam e outros caminham apressados. No centro, todos se encontram.


Postado por Ana Flávia de Oliveira

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